A reforma trabalhista e o diálogo entre as partes

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O projeto de Lei nº 6.787/2016 tem por escopo alterar substancialmente algumas normas previstas na Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, para adequá-las à evolução das relações trabalhistas no Brasil.

Atualmente sob análise do Senado, o projeto prevê mudanças muito interessantes para empregados e empregadores, após décadas de vácuo legislativo que impunham insegurança jurídica às novas relações de trabalho.

Segundo a sua justificação, o projeto em análise tem por objetivo “aprimorar as relações do trabalho no Brasil, por meio da valorização da negociação coletiva entre trabalhadores e empregadores, atualizar os mecanismos de combate à informalidade da mão-de-obra no país, regulamentar o art. 11 da Constituição Federal, que assegura a eleição de representante dos trabalhadores na empresa, para promover-lhes o entendimento direto com os empregadores, e atualizar a Lei n.º 6.019, de 1974, que trata do trabalho temporário”.

Desde sua propositura, diversas audiências públicas e discussões acirradas renderam, até o momento, mais de 1.300 (um mil e trezentas) emendas.

O fato que ninguém contesta é que a CLT,  editada em 1943, remonta ao Brasil rural, que dava os primeiros passos rumo à industrialização, e foi diretamente inspirada em normais paternalistas formuladas pelo fascismo de Mussolini para um Estado que se propunha a tutelar e obter controle sobre todas as atividades de seus cidadãos. Essa legislação, que por óbvio se traduzia em entraves burocráticos e formalismo excessivo, não mais se justifica no mundo contemporâneo, em constante avanço tecnológicos e que assiste ao surgimento de novas relações de serviço, como o teletrabalho, por exemplo.

Há de se convir que um diploma legal que ainda determina que a mulher casada não precisa pedir permissão do marido para litigar na Justiça trabalhista certamente precisa de mudanças! No mínimo, de uma atualização.

Dentre as alterações previstas pode-se destacar que o art. 2º, §3º determina que a mera identidade de sócios não configura responsabilidade solidária das empresas, sendo necessário a comunhão de interesses entre elas. É uma importante previsão, tendo em vista que, mesmo sem permissão legal, há diversas decisões judiciais redirecionando a execução de dívidas trabalhistas para outras empresas que possuíam um dos sócios em comum com a empresa executada, mesmo que entre elas não existisse qualquer relação.

Ao contrário do senso geral de que direitos estariam sendo retirados dos trabalhadores, a lei estipula multa de R$ 3.000,00 por empregado em situação irregular (art. 47), ou seja, sem registro.

Não será computado na jornada de trabalho o período de deslocamento da residência até o local de trabalho (art. 58, §2º). Até então, o assunto era “regulado” pelo TST, por meio da Súmula 90, que determinava como jornada de trabalho o tempo despendido pelo empregado, em condução fornecida pelo empregador, até o local de trabalho de difícil acesso, ou não servido por transporte público regular.

O banco de horas, até então somente implementável por acordo ou convenção coletiva, poderá ser pactuado entre empregado e empregador por meio de acordo individual escrito, devendo a compensação ocorrer em até 6 (seis) meses (art. 59, §5º). Também será possível adotar a jornada 12×36 apenas por acordo entre as partes.

É previsto e regulamentado o regime de teletrabalho (art. 62, III) sendo que referidos empregados estarão dispensados do controle e registro de jornada.

As férias poderão agora ser usufruídas em até 3 (três) períodos, sendo um deles de 14 (catorze) dias corridos e os outros dois de no mínimo 5 (cinco) cada um. O início das férias não poderá ocorrer nos dois dias que antecedem feriado ou repouso semanal remunerado.

Há previsão para contratação de autônomo com ou sem exclusividade, de forma contínua ou não, sendo afastada a qualidade de empregado desse profissional (art. 442-B). Total inovação.

Houve implementação do trabalho intermitente, em que o trabalho subordinado não se dá de forma contínua, determinado em horas, dias ou meses (art. 443, §3º), sendo que tal contrato deverá ser firmado por escrito. Ao final do período, o empregado deverá receber a remuneração pactuada, férias proporcionais, 1/3, 13º salário, repouso semanal remunerado e os adicionais legais.

As ajudas de custo, auxílio-alimentação (vedado o pagamento em dinheiro), diárias para viagem, prêmios e abonos não integrarão a remuneração do empregado (art. 457, §2º). Até então, o entendimento adotado era o de que, se a verba era habitual, integrava o salário para todos os fins.

Para fins de equiparação salarial, a diferença de tempo de serviço para o mesmo empregador não poderá ser superior a 4 (quatro) anos e o tempo na mesma função deverá ser de até 2 (dois) anos, prestigiando os empregados que possuem mais tempo de casa (art. 461, §1º). Na previsão atual, mesmo que um dos empregados tivesse anos de contrato, se havia menos que dois anos na mesma função, a equiparação salarial era reconhecida.

Não há mais necessidade de se homologar a rescisão do contrato no Sindicato, mas a entrega dos documentos rescisórios e o pagamento das verbas deverão ser realizados em 10 (dez) dias (art. 477, §6º). Também não é preciso autorização sindical para dispensas coletivas (art. 477-A).

Há a inclusão de nova figura que permite a extinção do contrato por acordo mútuo das partes, sendo devidos pela metade o aviso prévio, se indenizado e a multa do FGTS (20%), e na integralidade as demais verbas. Nesse caso, o empregado poderá movimentar 80% dos valores depositados de FGTS e não será possível se beneficiar do seguro desemprego (art. 484-A).

As partes em conjunto com o sindicato poderão promover termo de quitação anual de obrigações (art. 507-B).

Nas empresas com mais de 200 (duzentos) empregados será eleita uma comissão com mandato de 1 (um) ano para facilitar o diálogo entre a empresa e os colaboradores. Essa comissão será de 3 (três) membros para empresas que possuírem de 200 (duzentos) a 3.000 (três mil) empregados; de 5 (cinco) membros se a empresa possuir de 3.001 (três mil e um) a 5.000 (cinco mil) empregados; e de 7 (sete) membros para as que tiverem mais de 5.000 (cinco mil) empregados (art. 510-A). Esses empregados não poderão ser dispensados desde o registro da candidatura até 1 (um) ano após o término do mandato.

Uma das mais polêmicas alterações é a contribuição sindical deixar de ser obrigatória. Resquício evidente da inspiração fascista, a previsão de contribuição sindical obrigatória existe em poucos países, em razão de não se coadunar com a liberdade sindical prevista na Convenção 87, da OIT. De acordo com a nova norma, a empresa somente poderá fazer desconto das contribuições se os empregados autorizarem expressamente (art. 545 e 578). No mesmo sentido, os empregadores contribuirão com o seu sindicato se de seu interesse (art. 587). Crê-se que sem o financiamento assegurado pela força da lei, os sindicatos terão que representar seus associados de forma mais eficaz, o que significa outro ganho aos trabalhadores.

A convenção coletiva de trabalho e o acordo coletivo de trabalho terão prevalência sobre a lei quando dispuserem sobre os assuntos autorizados (art. 611-A): pacto quanto à jornada de trabalho; banco de horas anual; intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos para jornadas superiores a seis horas; adesão ao Programa Seguro-Emprego (PSE), de que trata a Lei nº 13.189, de 19 de novembro de 2015; plano de cargos, salários e funções compatíveis com a condição pessoal do empregado, bem como identificação dos cargos que se enquadram como funções de confiança; regulamento empresarial; representante dos trabalhadores no local de trabalho; teletrabalho, regime de sobreaviso, e trabalho intermitente; remuneração por produtividade, incluídas as gorjetas percebidas pelo empregado, e remuneração por desempenho individual; modalidade de registro de jornada de trabalho; troca do dia de feriado;  enquadramento do grau de insalubridade; prorrogação de jornada em ambientes insalubres, sem licença prévia das autoridades competentes do Ministério do Trabalho; prêmios de incentivo em bens ou serviços, eventualmente concedidos em programas de incentivo; e participação nos lucros ou resultados da empresa.

Há previsão determinando a prevalência do acordo coletivo em detrimento de convenção coletiva (art. 620, da CLT).

No âmbito processual, serão concedidos os benefícios de justiça gratuita para os que perceberem até 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios previdenciários (art. 790, §3º). Imagina-se que tal determinação tenderá a diminuir o número de litígios, pois atualmente basta mera declaração de hipossuficiência para que o empregado nada pague.

O advogado receberá honorários de sucumbência de 5% (cinco por cento) a 15% (quinze por cento) sobre o proveito econômico (art. 791-A). Até então, apenas os advogados com credencial sindical poderiam recebe-los.

O preposto não precisa ser empregado da empresa reclamada (art. 843, §3º), o que certamente facilitará muito a atuação das empresas que possuem negócios e filiais em vários locais.

Uma importante inovação que prestigia a autonomia de vontade, diminuição de litígios e a composição, é a possibilidade de as partes homologarem na Justiça do Trabalho acordo realizado extrajudicialmente, se formulado em petição conjunta e desde que estejam acompanhadas cada qual por advogado (art. 855-B). É um grande avanço que permitirá às partes resolverem suas avenças sem necessitar passar por todo o processo judicial.

A mudança é urgente. Sem dúvida, aumentará o diálogo entre as partes e a segurança jurídica das relações trabalhistas, tendo em vista que as alterações proporcionam maior flexibilidade para as partes amoldarem a legislação ao seu negócio.

A segurança jurídica se refletirá na esperada diminuição de litígios trabalhistas, pois a legislação, até então rígida e confusa, permitia diversas interpretações e decisões judiciais, as quais tendem a ser dirimidas com as modificações impostas pela lei.

Vale destacar, por fim, que os direitos dos empregados não foram excluídos; o que houve foi apenas a previsão de flexibilidade na norma trabalhista a fim de permitir que as partes negociem a prestação dos serviços de forma mais segura. O texto da lei efetivará o princípio da segurança jurídica no Direito do Trabalho e, a despeito do pessimismo de setores da sociedade, despertará confiança no empresariado e, espera-se, novas oportunidades de emprego, atenuando o momento crítico que atravessa a economia nacional.

POR: Portal Contábil

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